Notícias :: Alô, Alô, Hedy Lamarr! – A Tribuna 08/11/2025
Flávio Viegas Amoreira
Escritor, membro das academias de Letras de Santos e Praia Grande e curador da Casa das Culturas de Santos
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Sábado 08/11/2025
Alô, Alô, Hedy Lamarr!
Mulher de beleza estonteante, casada com a maior fortuna da Áustria, atriz mais controversa do cinema germânico, numa noite de 1935, depois de embriagar o marido nazista, foge com todas as joias para estrelar na América com o nome de Hedy Lamarr. Lamarr foi responsável pelo primeiro nu feminino do cinema em Êxtase, ainda na Europa, e reinaria nas matinês com reprises ininterruptas de clássicos como Sansão e Dalila.
O poeta jamais esqueceria sua primeira sessão no imenso Cine Caiçara, quando Lamarr dividia as telas com Victor Mature no épico bíblico num rito de iniciação. Hedy fugiu por não aceitar o papel de esposa troféu, nem de musa do regime nazista. Beleza e inteligência eram sinônimos. Madrugadas em fuga pela França, atravessando o Canal da Mancha até chegar a Hollywood, sem muito esforço para provar sua estupenda fotogenia e talento.
Com toda fascínio de Vivian Leigh e Rita Hayworth, Lamarr era a mais sublime e mesmo celeste atriz do cinema: dizia-se algo de transcendente. O segredo de Hedy era não caber num só molde, e a curiosidade encantada a surpreender o estereótipo de que beleza e erotismo não combinam com inteligência.
Quantos mitos de opressão sufocaram Lamarr dividida entre o cinema e a ciência. Com o compositor George Antheil de A Valsa da Dedilhada foi coautora de um sistema de comunicação que poderia ser usado para guiar torpedos de modo inviolável na defesa aliada. Sem ter ganhado crédito, suas sugestões foram decisivas em dispositivos de Wi-Fi, Bluetooth e, claro, o celular, nosso fetiche onipresente.
Hedy Lamarr, no olho do furacão, na Califórnia, celeiro de ideias e contatos certeiros, foi a proposição de que o mistério da mulher é afetos apreendidos pessoalmente da comunicação sem fio. Reclusa nos arredores de Orlando (sim, cidade do estado da Flórida é capaz de atrair charme), poderia ter sido reconhecida como ícone da ciência, mas preferiu o anonimato. Morreu em 2000, aos 86 anos, com o nome no Hall da Fama dos inventores, que logicamente não é tão popular quanto os de atletas. Criatividade, teu nome é mulher!
Com que coragem, desde os primórdios, foram mulheres como Lamarr audazes e sufocadas, a romper obstáculos em nome de ousar saber. Belo distico do latim sapere aude: ouse pensar por si mesmo! Obras e ideias paridas por mulheres quebrando o monopólio de machos entre guerras, disputa de poder e fundação de religiões excludentes.
Inesquecível sua filosofia de vida nestes tempos de acomodação e apatia bovinas: envolva-se. Esse é o segredo. Experimente. Junte-se a tudo que te aprimora. Conheça coisas e pessoas que te engrandecem além do brilho fácil. Curiosidade é outro nome da sabedoria. Reforço, ao leitor, para recomendar o ótimo romance biográfico de Marie Benedict, A Única Mulher, e, claro, reassistir Hedy Lamarr, conhecida como Estranha Mulher, que tem que se ver com um cinema de invenção e linguagem para pensar por si própria. Acaba de chegar o celular que dobra em três! Mulher é tantos!
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